segunda-feira, maio 22, 2006

Intervenção da Dra Cristina Varón de Carvajal

A análise deste problema de género, tem duas perspectivas antagónicas:
1.- Os defensores desta prática, com os argumentos de ser uma herança cultural, centrada essencialmente em definições sociais de feminilidade e em posturas relativas à sexualidade feminina, por forma de garantir a castidade e a fidelidade.
Essencialmente é um acto aprovado pelos povos como parte da identidade cultural; o que tem um significado profundo, sentido de lealdade para com afamília e crença num sistema de valores (rito de passagem da adolescença à fase adulta).
2.- Por outro lado temos os contestatários da MGF, que a consideram como um ritual nefasto para integridade da pessoa, que viola os direitos da criança e os direitos humanos, trazendo consequências graves, quer físicas, quer psicológicas. A Dra. Débora Diniz, no seu artigo "A Cirurgia da Mutilação Genital Feminina", faz referência à existência desta prática, em 28 países do mundo. Apesar de ser uma prática ancestral proibida desde 1966, continua a ser evidenciada. O respeito pelos valores e tradições culturais não significa que sejam intocáveis, inquestionáveis, levando-nos desta maneira a reflectir sobre a exigência universal da Tolerância. Então surge a questão: Qual deve ser o limite do tolerável? E o mais importante: Quem o decide? Terá isto a ver com os direitos humanos universais? A Emigração dos povos praticantes da MGF está a originar alterações sociais que nos faz repensar no contexto do Trabalho Social, uma nova postura de intervenção que implique responsabilidade, empenhamento e compromisso na integração social destes grupos. Será que a prática continuada da MGF nos países acolhedores é um sintoma dos problemas de "Integração"? Será que os problemas sociais agravados pela globalização, tem deixado de lado a importância da multiculturalidade no enriquecimento da humanidade? Implicará Integração a capacidade crítica e análise da própria cultura, a aceitação de novos valores, de regras sociais? De acordo com o trabalho da Dra. Mafalda dos Santos, "Portugal é considerado um pais de risco porque acolhe famílias provenientes de países que praticam a MGF e a falta de preparação da sociedade é uma alerta." Esta preocupação, tem que conduzir à realização de programas de prevenção e intervenção com estas comunidades, a nível de educação, acompanhamento e estratégias de tratamento específico que impliquem um trabalho multidisciplinar.
Por último gostaria de referir o projecto elaborado pela Associação para o Planeamento da Família e a Comissão para a Igualdade e para os Direitos das Mulheres, onde há uma proposta de intervenção e informação a partir de:
1.- Questionamentos dos Tabus, da Sexualidade masculina e feminina.
2.- Programas de intervenção após da avaliação do risco e das comunidades migrantes, com vista à identificação das mulheres e raparigas que tenham sofrido atentados contra a identidade física e psicológica. As estratégias de acção devem ir de encontro à fomentação da igualdade e à autonomia de géneros, evitando discursos estigmatizantes a determinados grupos étnicos. Se conhecemos as razões que as próprias populações têm para a prática da MG, é possível fazer a desconstrucção das mesmas enfatizando as consequências visíveis que esta prática implica, como esterilidade, infecções, hemorragias,etc.
A outra estratégia deverá ter como objectivo a realização de um trabalho comunitário, no qual os homens possam participar, sendo informados e tomando consciência da responsabilidade, face aos problemas que afectam e incidem directamente na saúde das mulheres e raparigas, assim como a sua repercussão no bem-estar da própria comunidade e consequência sócio-económica e psicológica para o grupo familiar.

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